PsicoLOUCOlogia, por Tiago Vilela

Para comemorar o dia do Psicólogo em 27 de agosto, vou conversar com você sobre os mistérios que rondam essa profissão e, de quebra, calar as perguntas que insistem em aporrinhar nossa vida profissional. Por exemplo: psicólogo é pra gente louca? De médico, poeta e louco, todo mundo tem um pouco (como já dizia minha avó) então esse artigo é pra você também.

por Tiago Vilela, para outrosquinhentos.com*
17/08/2022 21h56

Nos primórdios dessa ciência, o profissional Psicólogo era visto como um ser centrado, protegido de problemas, dotado de poderes mentais, dono de todos os seus impulsos e capaz de enxergar todos os dilemas e conflitos individuais através da testa das pessoas. Vai dizer que nunca pensou em perguntar pra um Psicólogo se ele tá te analisando na fila do supermercado, na mesa do bar, na reunião de família?

É possível? Até que sim, mas a resposta é provavelmente não. Não é só de poderes mentais que vive o Psicólogo, a gente também tem vida humana, precisa comer e dormir, gosta de fofoca, gosta de novela, faz barraco, arruma encrenca e tem problemas, inclusive emocionais

Eu por exemplo quando vou à praça de alimentação compro minha comida, sento pra comer e fico olhando o prato dos outros me perguntando se eu não deveria ter pedido o que outro tá comendo porque pode ser que esteja mais gostoso. É verdade esse bilhete.

Até pouco tempo atrás, quase nada se falava ou se entendia sobre saúde mental ou qualidade de vida emocional, até que diversas síndromes psicológicas, que já existiam, começaram a pipocar nos stories e nas mídias sociais de forma geral, no nosso dia a dia. Ser bipolar, depressivo, esquizofrênico, ter TDAH ou um transtorno de ansiedade tá virando praticamente uma exigência social. Se você não tem ou tem e não assume socialmente que tem, não vai virar uma hashtag.

Sociopatas e psicopatas? Nunca estiveram tão na moda. Como Psicólogo, eu diria que conheço uns três ou quatro; agora, falando como pessoa, eu acho que conheço uns vinte.

As loucuras nossas de cada dia que nos damos hoje sempre estiveram por aí. A diferença é que a custódia delas caíam no colo de Psicólogos e Psiquiatras. Isso gerou – e ainda gera – muito preconceito. Falta de respeito? Não. Falta de entendimento e informação mesmo.

Levou tempo para que a sociedade começasse a compreender o ser humano com um ser psicossocial, um ser cujo o comportamento – consciente e inconsciente – é regido por valores e referências culturais, bem como é um ser que interfere na formação e transmutação desses fatores. É simples assim. Não parece, mas é.

Nesse sentido, o Psicólogo busca elencar pensamentos, doutrinas, padrões, valores, referências que impactam nas suas decisões; trabalha para que você enxergue essas questões e se torne uma pessoa mais consciente daquilo faz com você mesmo, para que faça escolhas que façam você se sentir melhor, mais feliz, menos perturbado, menos acometido por crises existências de desfechos negativos. Por meio do seu conhecimento, o Psicólogo trabalha para que o comportamento humano concorra para uma plena harmonia da saúde mental e física.

E, afinal, Psicólogo é só pra gente louca?

Depende. Loucura na perspectiva de quem? Do seu vizinho? Do seu pastor? Do seu candidato à Presidente? Do seu chefe? Da comunidade em que você vive? Do seu Deus? Do seu próprio ego? Dos seus colegas de trabalho? E se o louco for o outro, que te julga, e não você?  A ignorância das pessoas sobre esse tema leva a uma fuga da relação com o profissional da Psicologia, seja por medo, por insegurança, por incerteza, e principalmente por preconceito.

Embora já seja um tema que vem sendo amplamente abordado na tv, em filmes, telenovelas, jornais e programas do dia a dia, as pessoas insistem em banalizar e taxar a necessidade de um trabalho psicológico como vergonhoso. O aspecto só fica relevante quando o sujeito é você ou alguém da sua família. Crises de ansiedade, estresse, depressão, esquizofrenia, autismo, burnout, pânico, staff mental são condições que já existiam antes de você colocar nos seus stories, mas o povo dá importância pra isso quando alguém perto dele – ou ele próprio – está adoecendo.

E pra alegria geral da nação, quando tudo parece que não tem mais jeito, estamos os Psicólogos  seguindo firme, com ou sem fama de doutor e muitas vezes bem mal valorizados, dentro e fora dos consultórios ou dos hospitais de saúde mental.

Pra você ter uma ideia, os estudos em psicologia englobam desenvolvimento de técnicas para melhorar o desempenho mental, medir e potencializar a inteligência e funções cognitivas, amparar e melhor estruturar os processos de aprendizagem e desenvolvimento mental, evolutivo e psicomotor.

O psicólogo está nas escolas, atuando com processos de educação, alfabetização, dando apoio moral e emocional aos alunos, aos professores, aos parentes dos alunos; o psicólogo está nos hospitais acompanhando doentes, cirúrgicos e seus familiares, dando suporte emocional (o que concorre para uma melhora na recuperação da saúde como um todo); também está ali para amparar a equipe médica. Pode parecer fúnebre e insensível, mas é real: os psicólogos também estão em hospital acompanhando pacientes terminais e seus familiares, acolhendo suas angustias e trabalhando as sensações que rondam a possibilidade de luto.

Psicólogos estão no esporte dando subsídio emocional, tanto em trabalhos e projetos sociais como com atletas de alto desempenho; estão nas empresas fazendo avaliação de potencial e comportamento dos colaboradores, atuando com treinamento, desenvolvimento, seleção de profissionais.

Psicólogos estão nas cadeias, nas casas de reabilitação de dependência química, nos sanatórios; psicólogos estão atuando em casas e atividades sociais junto a moradores de rua e abandono, psicólogos estão atuando junto ao poder judiciário em processos de guarda, adoção, divórcio, proteção ao menor; estão nas universidades como professores e pesquisadores. Estão na arte, na TV, no teatro, na música.

Ah, e sim, estão em clínicas atuando com pessoas diagnosticadas com algum transtorno mental, gente com insônia, tem gente em luto por ter perdido um ente querido, um amigo, uma companheira; tem gente na clínica sofrendo uma desilusão, uma doença degenerativa, uma crise existencial; tem gente como a gente que de vez em quando tem uma crise ansiosa diante do preço da gasolina e da carne. Inclusive o seu Psicólogo deve ter um Psicólogo pra cuidar da crise existencial, dos boletos a vencer, das encrencas no relacionamento, das dúvidas e indecisões que ele também tem.

E psicólogo também é gente, também sofre, também tem sonhos, também se desentende com os amigos, com a família; também tem crises, sofre de ansiedade e reclama do preço da gasolina e do óleo de cozinha.

A diferença é que a gente, Psicólogo, passou alguns anos na cadeira da faculdade estudando o que você está pensando, porque está pensando e como isso que você tá pensando tá virando um comportamento. Mais ou menos isso.

Aos meus queridos colegas Psicólogo, parabéns!! Luz e força pra gente lidar com as nuances do comportamento (do próprio, principalmente).

E pra você que quer saber se eu tô te analisando na praça de alimentação, relaxa. Pra analisar, baby, eu cobro caro. Provavelmente estarei olhando e desejando o seu prato de batata frita e me perguntando se não deveria ter comprado o que você está comendo.

*este conteúdo é uma contribuição de Tiago Vilela, músico e psicólogo. Os textos dos colunistas são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente expressam a opinião de outrosquinhentos.com
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